quarta-feira, 21 de julho de 2010

Epitáfio

No dia em que eu morrer não quero tristes as pessoas que amo - só em pensar nisso já me domina um sentimento angustiante. Quero todos rindo. Tudo bem, não precisa dar gargalhadas, tenho ciúmes que se divirtam sem mim.. Mas riam! Não deixem que as lágrimas tomem conta desse dia. Nunca gostei de momentos depressivos, me entediam. Ao meu redor sempre tentei cativar risadas e alegrias, não vai ser diferente dessa vez.
Riam do meu nariz grande e do meu cabelo ruim. Riam ainda mais do meu nariz, que mesmo depois da plástica, continuou grande e torto... ele merece boas risadas. Das minhas fotos dignas de "pasta z" e do meu jeito de andar. Dos meus tênis sujos e o mau cheiro que eles causam. Do dia que fui pra balada com uma blusa de paetê e do dia que pisei no coco e fui pra sala de aula. Não deixem de contar meus podres só porque eu estou morto. Não sou egoísta o suficiente pra enterrá-los comigo, e nesse dia, eu não vou estar mais por aqui pra achar bom ou ruim. Não quero levar segredos pro túmulo, pode jogar tudo na roda! Abram o jogo.
Contem pra todo mundo o que eu fazia quando estava bêbado (menos que beijei uma pessoa mais velha que a minha mãe). Falem nossas histórias bizarras e que só aconteciam com a gente. Das noites nas baladas, na RDV e em cima da cama-sustentada-pelos-livros. Falem que eu planejava minhas aulas no ônibus a caminho da escola; que eu fazia vocês passarem vergonha em lugares públicos e até mesmo que eu tinha medo do Michael Jackson e do Osama. Descrevam minha tensão quando viajávamos na BR. Digam como eram nossas viagens; que meu cabelo tinha uma parte que não subia; que ao sorrir meus olhos sorriam junto e um sempre ficava mais fechado que o outro. Falem das minhas gordurinhas; do meu dente de leite e também das minhas histórias de escola. Riam de mim por ter conseguido reprovar em 6 matérias na faculdade! Questionem minha família sobre as palavras que falava errado na infância. Não tenham dó em me criticar, nunca fui um modelo de perfeição e sempre soube lidar muito bem com isso, mas não sejam cruéis o bastante para omitir minhas qualidades.
Falem de mim: quem era e quem queria ser. Falem como eu era.. Falem. Não deixem que minhas memórias fiquem enterradas pra sempre. Levem uma lembrança minha, carreguem-a com vocês. Não posso admitir que a morte me impeça de estar com quem amo.

(Augusto Cruz)